sexta-feira, setembro 23, 2005

POEMAS LIDOS NA SESSÃO Nº 18



(02)

havia sobre a mesa, mangas maduras,
um copo d´água de côco bem gelada,
uma flor desconhecida,
mas de aspecto dulcíssima, e carnuda,
de onde se extraía só com o olhar,
a beleza mais voluptuosa já vista
- esta flor agonizava no vaso,
numa morte lânguida, e morria digna.
havia abacates apodrecendo dentro do frigorífico
e limões graúdos, intocáveis.
havia uma ausência de fome
no quarto desabrochado
onde os amantes, nus, saciados,
desprezavam a fatia de carmim de melancia
exposta na mesa da cabeceira.


(04)

deixas que preencha tuas mãos
com o meu sexo úmido,
e feito cortesã, puta cadela,
um desonrado anjo azul,
permitas que ponha a cabeça,
pulsando rubra, trêmula donzela,
nos teus lábios macios, e faça desta maçã
um néctar deslizando na língua vibrátil.
fecha os olhos, não me olhe,
nem de viés, temo que desperte do extâse.
vejo que tremes o peito
e as narinas cantam
como o vento mais brusco.

apoiando-se na cama,
ergue lentamente os joelhos ossudos,
sentindo o mel do melhor
e suspira,

suspira a eternidade de um amor sem máculas.


Antonio Naud Júnior
da série «GOZO Y SOMBRAS» (poemas eróticos pensando em Konstantinos Kaváfis)
Cádiz (Espanha) 2005.



De coração vazio

Nós que nunca chorámos um único dia deixado por viver
Não iremos ter quem nos limpe as lágrimas ao lembrarmos o que deixámos por fazer
Então um dia iremos sentar-nos sem encarar a noite e
esperar o amor passar
Aguardar as horas mais perdidas sem nunca as ver regressar

Tal como uma vez, ingénuos os amantes prometeram amar-se
num grito rouco
Nunca eles tinham adivinhado as suas palavras num breve sufoco

Somos uma vida deixada por acidente numa jovem palma da mão
De quem tem boca mas nunca arrisca dizer sim ou não

Tudo nos foi dado, cada dia e cada sentimento
Um vago amor, seguido do abrupto arrependimento
E fugimos das paredes que falam repetindo versos de poesia
que nós cantávamos
De coração vazio em direcção ao nada, desencontrados com o fim que ansiávamos

Maria Gomes, in revista "Singularidades, nº24", Nov. 2004


Sozinhos sem reparar

Dizem que a porta de casa está sempre aberta para quem se lembra do caminho
Mas já são tantas as pessoas que não caminham temendo deixar o seu rasto no chão
Como marcas na lama para toda a gente ver e apontar, olhar de perto e até tocar
Todos nós que mentimos até acreditar, todos os que perdoamos e não esquecemos
Estamos sozinhos sem reparar, e sem respirar continuamos a pensar em viver
E guardados pela solidão esperaremos até nenhum coração bater
E se olharmos pela janela, até o vento parou para ver

Maria Gomes, in "Singularidades, nº25", Maio, 2005



MONSERRATE

Digo monserrate.
A palavra toca das suas inúmeras patas o meu corpo desviado.
...a concavidade do som que se desfaz em bola de
sabão sobre o terreiro que aquaticamente estala, os anos
que passam ao fundo...

Alexandre Vargas, in “Vento de Pedra”, Moraes Editores, Lisboa, 1981.

4 comentários:

Anónimo disse...

Outros poemas lidos na mesma sessão:
De Maria Gomes (n. Dezembro, 1989):

De coração vazio

Nós que nunca chorámos um único dia deixado por viver
Não iremos ter quem nos limpe as lágrimas ao lembrarmos o que dixámos por fazer

Então um dia iremos sentar-nos sem encarar a noite e
esperar o amor passar
Aguaradar as horas mais perdidas sem nunca as ver regressar

Tal como uma vez, ingénuos os amantes prometeram amar-se
num grito rouco
Nunca eles tinham adivinhado as suas palavras num breve sufoco

Somos uma vida deixada por acidente numa jovem palma da mão
De quem tem boca mas nunca arrisca dizer sim ou não

Tudo nos foi dado, cada dia e cada sentimento
Um vago amor, seguido do abrupto arrependimento
E fugimos das paredes que falam repetindo versos de poesia
que nós cantávamos
De coração vazio em direcção ao nada, desencontrados com o fim que ansiávamos

in revista "Singularidades, nº24", Nov. 2004

* * * * * *

Sozinhos sem reparar

Dizem que a porta de casa está sempre aberta para quem se lembra do caminho
Mas já são tantas as pessoas que não caminham temendo deixar o seu rasto no chão
Como marcas na lama para toda a gente ver e apontar, olhar de perto e até tocar
Todos nós que mentimos até acreditar, todos os que perdoamos e não esquecemos
Estamos sozinhos sem reparar, e sem respirar continuamos a pensar em viver
E guarados pela solidão esperaremos até nenhum coração bater
E se olharmos pela janela, até o vento parou para ver

in "Singularidades, nº25", Maio, 2005

Desta jovem poeta espera-se e deseja-se que continue a ser bafejada pelo alento das musas e sirva de estímulo para outr@s jovens no Amor pela Literatura.
Bem hajas, Maria!

MeninosdaAvo disse...

Muito obrigado pelos poemas! Infelizmente nenhum dos colaboradores tinha conseguido ficar com eles! Se for necessário alguma correcção à estrutura ou a forma como os versos terminam é bem vinda pois queremos ser sempre fieis aos poemas!
Fica mais uma vez o convite à Maria para futuras presenças nas sessões e colaborações! Apreciámos bastante os seus poemas!

Anónimo disse...

Belos poemas, Antonio.Vc realmente é um mestre da palavra. Quando volta para o nosso Brasil para fazer coisas belas por aqui? Beijos.Neuzamaria

Anónimo disse...

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